... de conto em conto e reconto
Procurou-se analisar a questão a partir do pressuposto de que a literatura de cordel nordestina contém mais afinidade com os romances orais do que com os cordéis lusitanos, devido à característica poética presente nos dois gêneros.
Você sabia que contos, provérbios, canções, mitos e lendas
também podem ser considerados patrimônio cultural?
Cada povo encontrou meios de transmitir conhecimentos e
costumes e até de registrar momentos da própria história através da oralidade.
A mídia mesmo teve suas origens assim. Ainda na antiguidade, as notícias eram
comunicadas em praça pública para grandes multidões de maneira falada e, no
boca a boca, se espalhavam por todo o povoado.
Artifícios como métrica, rima e ritmo são utilizados desde
sempre na transmissão oral de informações, de forma a tornar essa transmissão
mais eficiente e os conteúdos narrados mais fáceis de memorizar.
Algumas estruturas e formas de contar foram se constituindo
entre os povos através da repetição do conteúdo de maneiras específicas,
transformando-se em verdadeiros repertórios e a esses repertórios passados de
geração a geração dá-se o nome de tradição oral.
O cordel, literatura muito popular aqui no Brasil, sobretudo na região Nordeste, traz impresso em si essas marcas. Suas origens apontam para os romances orais, ou rimance (forma arcaica da palavra romance) construção literária típica da Península Ibérica que equivale à balada europeia, poema épico curto e sempre cantado. E a gente aproveita a deixa do post sobre o mestre cordelista Leandro Gomes de Barros e apresenta aqui mais uma de suas obras:
As Misérias da Epocha
Se eu soubesse que esse mundo
Estava tão corrompido
Eu tinha feito uma greve
Porem não tinha nascido
Minha mãi não me dizia
A queda da monarchia
Eu nasci foi enganado
Pra viver n'este mundo
Magro, trapilho, corcundo,
Alem de tudo sellado.
Assim mesmo meu avô
Quando eu pegava a chorar,
Elle dizia não chore
O tempo vai melhorar.
Eu de tolo acreditava
Por innocente esperava
Ainda me sentar n'um throno
Vovó para me distrahir
Dizia tempo ha de vir
Que dinheiro não tem dono.
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Só se ver hoje no mundo,
Agonia e desispero,
Fiscaes e procuradores
E numero de cobradores
Pondo tudo amedrontado
E para mais nossa melhora
Qualquer que nascer agora
O pai há de o ver sellado.
Dizem os filhos da Candinha
Que na camara dos deputados
Querem formar um projecto
Para os homens serem sellados,
Isso faz repugnar!
E pudemos acreditar.
Que o imposto não nos larga,
Podemos aguardar as horas
Que montem em nós com esporas
E nos façam carregar carga.
Havemos de andar agora
Do imposto amendrontados,
Com mil e cem de estampilhas
Nos chapeus e nos calçados
O que havemos de fazer?
Já não se pode soffrer
O fio da cruel fome
Os homens todos alerta
O Estado nos aperta
O municipio nos come.
*Cordel de data anterior a 1906.
*Coleção Digital: Folhetos Raros - Poemas em Fragmentos