Entusiasta da tradição oral, a Aletria não disfarça seu apreço pela métrica, pelo ritmo e pelas temáticas ligadas à cultura popular e sua oralidade. Passeando pelas estantes da Aletria encontramos as famosas quadrinhas, tão ao gosto popular; os haicais, que vindos da cultura oriental encontraram solo fértil em terras brasileiras, onde foram reinventados aos montes; a literatura de cordel, que, com sua famosa redondilha maior, cantou e ainda canta o nordeste brasileiro; os tangolomangos e contos cumulativos, que sabem como ninguém encantar crianças e adultos em rodas de contação de histórias.
Para manter a pose de entusiasta da causa, o Blog da Aletria traz uma série de breves posts sobre autores, de língua portuguesa, que se tornaram verdadeiros mestres quando o assunto é literatura e tradição oral. Começamos falando um pouco sobre o mestre Leandro Gomes de Barros, considerado o pai da literatura de cordel no Brasil e autor do clássico folheto “O Soldado Jogador”, o primeiro cordel brasileiro que se tem notícia.
O paraibano Leando Gomes de Barros, nascido em 1865 na cidade de Pombal, escreveu modestos 240 folhetos e foi recordista de vendas, chegando a casa dos milhões de exemplares vendidos em algumas de suas obras! Leandro morreu de morte morrida aos 52 anos em Recife, vítima da gripe espanhola. Hoje seus cordeis ainda são impressos e reimpressos pelo Brasil afora, mostrando que os cordeis e suas redondilhas ainda são atuais, encantando leitores e ouvintes com seu ritmo gostoso de ouvir.
Acima, xilogravura com o retrato de Leandro Gomes de Barros.
Fica a sugestão da Aletria: ler em voz alta “O Soldado
Jogador” de Leandro de Barros! ;) Segue abaixo um trechinho do folheto, para
ler na íntegra acesse AQUI o Fac-símile de uma edição bem antiga dessa folheto.
Era um soldado francês
Que se chamava Ricarte
Jogador de profissão
E nunca foi numa parte
Que não trouxesse no bolso
O resultado da arte.
Os franceses nesse tempo
Tinham por obrigação
O militar ou civil
Seguir a religião
O Papa deitava a lei
Botava em circulação.
Ricarte, soldado velho
Com trinta anos de tarimba
Aonde ele achava jogo
De lasquinê ou marimba
Dizia logo: – Eu vou ver
Água na minha cacimba!
Um dia faltou-lhe o soldo
Pôs-se Ricarte a pensar
Onde podia haver jogo
Que ele pudesse jogar
Era domingo e a missa
Não havia de tardar.
Dinheiro não tinha um “xis”
A crédito ele nem falava,
Pois o soldado francês
Na taberna onde comprava
Só pegava no objeto
Porém depois que pagava.
Sobre a métrica da literatura de cordel:
A métrica mais comum na literatura de cordel brasileira é a
redondilha maior que, trocando em miúdos, quer dizer que cada um dos versos
possui sete sílabas poéticas. Os cordeis, em geral, são construídos em
sextilhas, ou seja, possuem 6 versos em cada estrofe. Já as rimas dos versos em
sextilhas populares, quase sempre, são construídos na forma ABCBDB. Em outras
palavras, rimam-se o segundo, quarto e sexto versos. Observe nesse outro
trecho de “O Soldado Jogador”:
Ricarte
foi para a missa
- A
Com grande constrangimento,
- B
Era
obrigado a cumprir
- C
A lei do seu regimento
- B
Mas
não podia afastar
- D
O jogo do pensamento. - B
Gostou? Na estante da Aletria também tem literatura de cordel! Salopão: um jumento do sertão, escrito pelo Mestre Fernando Limoeiro e ilustrado pelas xilogravuras de Tales Bedeschi, traz a tradição do cordel até em seu cuidadoso projeto gráfico, do designer Romero Ronconi, que reproduz as tradicionais cores rosa, verde, azul e amarelo das tradicionais edições de folhetos de cordel. Como se fosse pouco todo esse “cartaz”, Salopão: um jumento do sertão ainda foi selecionado para representar o Brasil na última Feira de Bolonha, a maior feira literária de obras infanto-juvenis do mundo! Haja responsabilidade, Salopão!
As duas imagens acima foram fotografadas por "Miúda Children`s Book"